“Às vezes, a única coisa verdadeira num jornal é a data”
Luís Fernando Veríssimo

terça-feira, 30 de junho de 2015

Com críticas aos jornais, Luciano Martins Costa se despede do Observatório

Por Luciano Martins Costa
No Observatório da Imprensa
Este observador vai interromper por tempo indeterminado suas análises diárias da imprensa brasileira através deste canal. Uma crise de gestão torna insustentável a manutenção desse trabalho, que vem sendo feito quase ininterruptamente, desde o dia 16 de julho de 2007. Ainda antes disso, este colaborador participou dos esforços para a criação e consolidação deste espaço para a crítica democrática da mídia desde seus primórdios, há mais de quinze anos.
Os motivos que levam à interrupção desta jornada são muitos, entre os quais não é possível fazer uma hierarquia de relevâncias. Talvez fosse possível contornar alguns deles, mas há uma causa que não pode ignorada: não há muito mais o que se analisar na mídia informativa brasileira.
Os principais veículos da imprensa se transformaram em panfletos políticos e vasculhar o noticiário em busca de jornalismo que valha uma referência tem sido como buscar um fio de cabelo no palheiro.
Naquela data de estreia, 16 de julho de 2007, uma segunda-feira, o Brasil já estava imerso em um escândalo político, mas o observador destacava que a Folha de S.Paulo era o único dos grandes diários de circulação nacional que ainda apontava o dedo para suspeitos de todos os matizes. Nas edições daquele final de semana e da segunda-feira, o jornal paulista havia aberto espaços proporcionalmente adequados tanto para os acusados que eram da aliança governista quanto para os da oposição.
Esse era o quadro do escândalo da época, segundo a visão do observador: “Enquanto o Globo e o Estado de S.Paulo dão claramente mais destaque para os casos de Renan Calheiros e da quadrilha que atuava na Petrobras, a Folha mantem sob os holofotes, com destaque, as irregularidades na CDHU – Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano, que respinga no deputado Mauro Bragato, ex-secretário do governo Geraldo Alckmin”.
Como se pode constatar, pouca coisa mudou no cenário da imprensa nacional desde então. Corrupção era o tema de maior destaque, e no comando da seleção de futebol um técnico chamado Dunga boicotava jornalistas da emissora SporTV. Uma diferença: o Brasil comemorava a conquista da Copa América.
Boa sorte
Naquela ocasião, as revistas Veja e Época faziam jornalismo, ainda que já mostrassem sinais de certa tendência maniqueísta. A revista mensal Os Brasileiros se apresentava como um projeto que tentava reviver o modelo das reportagens de fôlego, cujo exemplo maior havia sido a revista Realidade, da Editora Abril. O então presidente Lula da Silva iniciava seu segundo mandato, e os jornais repercutiam as novas políticas sociais com estatísticas sobre desigualdades de todos os tipos.
Nesta terça-feira (30/6), o que se lê na imprensa hegemônica não guarda mais qualquer relação com jornalismo de qualidade. As manchetes dos três diários de circulação nacional fazem uma leitura enviesada de declarações da presidente Dilma Rousseff, evitando entrar no mérito de sua manifestação: a inquietante constatação de que a Justiça tem pautado suas ações no escândalo da Petrobras com base na delação de indivíduos cujo destino depende de sua disposição para justificar os pressupostos da investigação.
O propósito da visita da presidente aos Estados Unidos – reanimar as relações conturbadas pelo episódio de espionagem revelado dois anos atrás, encaminhar acordos sobre a questão climática e estimular investimentos – ficou em segundo plano. A única pauta que interessa à mídia tradicional do Brasil é a agenda da desconstrução da aliança que controla o Poder Executivo desde 2003.
Mas essa é uma questão que os leitores atentos reconhecem em cada linha do noticiário, em cada expressão dramática nas faces dos apresentadores dos telejornais de maior audiência. Os demais – aqueles que tomam por verdadeiro tudo que sai na imprensa – seguirão repetindo a linguagem chula dos pitbulls que trucidam a língua culta e subvertem a narrativa jornalística.
Este observador se retira, sem prazo para retornar.
Os primeiros artigos escritos para este Observatório da Imprensa tratavam de sustentabilidade e de propostas para superação da crise que desde então ameaçava o futuro dos jornais.
Esta derradeira observação não pode ser mais otimista, em relação à mídia tradicional, do que as daquele tempo. Mas sabemos todos que, uma vez colocada a lente da crítica sobre a imprensa, você nunca mais vai ler jornal do mesmo jeito.
http://jornalggn.com.br/noticia/com-criticas-aos-jornais-luciano-martins-costa-se-despede-do-observatorio

terça-feira, 9 de junho de 2015

Tenho que gravar isso

FHC e a hipocrisia da indignação com os boatos

 
Fim de governo, FHC sai com os mais baixos índices de popularidade da história. Tornou-se o saco preferencial de pancadas. Defendê-lo era tarefa inglória, mesmo para os seguidores mais empedernidos.
 
Viaja a Paris e um colega da Folha solta o boato de que tinha adquirido um apartamento na avenida Foch.
 
Apesar de ter sido um crítico permanente de sua falta de dimensão pública, saí em sua defesa, sabendo que o apartamento em questão pertencia à família do ex-governador Abreu Sodré, sogro de Jovelino Mineiro, parceiro e sócio de FHC em alguns negócios.
 
A defesa quase resultou em uma briga com este meu colega de Conselho Editorial da Folha, que divulgara o boato.
 
Tempos depois fui alvo de uma campanha difamatória da revista Veja, bancada por Daniel Dantas, estreitamente ligado a FHC. Surpreso com a virulência dos ataques, telefonei a FHC, na esperança que jogasse um mínimo de bom senso na cabeça infame de Roberto Civita.
 
Sua reação confirmou tudo o que sabia de seu caráter fraco. Esquivou-se alegando que conhecia apenas Eurípides Alcântara.
 
A campanha infame prosseguiu através do blog de Reinaldo Azevedo, atacando minha honra, minha família, de uma maneira vil.
 
Tempos depois entendi o que um assessor do ex-senador ACM me disse certa vez, para justificar o ódio que ele tinha de FHC: "Ele fala uma coisa pela frente. A gente vira as costas e ele está falando outra e semeando intriga".
 
Tempos depois, fico sabendo que FHC foi o principal estimulador da mudança da linha da revista República, criada pelo Luiz Carlos Mendonça de Barros para tentar ventilar um novo programa para o PSDB. De defensora de um novo desenvolvimentismo tornou-se um  esgoto a céu aberto, emulando Veja nos ataques indiscriminados a adversários.
 
Quando a revista entrou em crise, FHC convidou cinco presidentes dos maiores grupos econômicos do país - Itau, Santander, Camargo Correia, Andrade e Gutierrez - para bancar a revista. O encontro foi na casa de Andrea Matarazzo, no Morumbi.
 
Dada a palavra ao novo redator-chefe, seu discurso radical espantou de pronto os candidatos a patrocinadores. Apenas a Camargo Correia ousou, valendo-se de seu caixa 2 para não deixar rastro. Mas o aval de FHC foi essencial para que o estilo esgoto passasse a ser o discurso padrão do PSDB.
 
Recentemente, dois funcionários  do Instituto Fernando Henrique Cardoso foram processados por espalhar boatos contra Lula. Não eram meros blogueiros pagos, mas pessoas da sua estrita confiança.
 
Ao se indignar com ataques que vem sofrendo da blogosfera, levantando novamente o boato do apartamento em Paris, FHC confirma dois dados objetivos: não tem apartamento em Paris; e também não tem caráter.
 
Que desminta os boatos. Mas demonstrar indignação é hipocrisia.
http://jornalggn.com.br/noticia/fhc-e-a-hipocrisia-da-indignacao-com-os-boatos

segunda-feira, 8 de junho de 2015

Órgãos da sociedade civil alertam sobre fim da rotulagem de transgênicos

Nova lei substitui simbolo do triângulo amarelo com um T na cor preta por frase 'contém transgênico' (Stefano Wrobleski/Repórter Brasil)
Nova lei substitui simbolo do triângulo amarelo com um T na cor preta por frase ‘contém transgênico’
(Stefano Wrobleski/Repórter Brasil)
Andreia Verdélio
da Agência Brasil
A aprovação, na Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei 4.148/2008, que propõe mudanças nos rótulos de embalagens de alimentos transgênicos, gerou reações de entidades da sociedade civil, segundo as quais a proposta tira da população o direito de escolha de consumir ou não produtos cuja matéria-prima foi geneticamente modificada.
Segundo a pesquisadora do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) Ana Paula Bortoletto, doutora em nutrição e saúde pública, a retirada do símbolo de transgênicos fere totalmente o direito do consumidor à informação clara, correta e precisa em relação aos produtos que estão no mercado.
Para a presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea), Maria Emília Pacheco, a rotulagem de transgênicos abre portas para a regulamentação de laboratórios e da rastreabilidade dos alimentos, e esse projeto dá um passo atrás sobre isso. “O consumidor tem direito de saber se aquele produto contém o DNA de outra espécie. Por razões de ordem ética ou religiosa, as pessoas têm o direito de ser informadas e decidir não consumir. Esses projetos que flexibilizam as normas também vão anulando as nossas outras conquistas”, disse.
O projeto do deputado federal Luis Carlos Heinze (PP-RS) altera a redação do Artigo 40 da Lei nº 11.105/2005 e, na prática, revoga o Decreto 4.680/2003, que regulamenta o assunto. Com a nova lei, as embalagens que contêm produtos geneticamente modificados não precisariam mais trazer o símbolo do triângulo amarelo com um T na cor preta no meio. Em vez disso, seria grafada a frase “contém transgênico”. Apenas os produtos que contêm 1% ou mais de componentes transgênicos na formulação seriam obrigados a informar a transgenia ao consumidor, se detectada em análise específica.
Heinze explica que a rotulagem vai permanecer, apenas o símbolo será retirado. Segundo o deputado, a letra T não informa e sim amedronta o consumidor, já que se assemelha a símbolos de produtos venenosos e inflamáveis, por exemplo.
A pesquisadora do Idec diz que, na prática, o projeto acaba com a rotulagem. “O argumento é que vão ser obrigados a informar no rótulo os produtos que tiverem a identificação de transgenia em laboratório. É um detalhe técnico que dificulta ter essa informação porque, como a detecção só acontece se tivermos o DNA, o material genético do alimento transgênico, quase nenhum alimento processado, industrializado, vai ter o DNA inteiro para fazer essa análise. Então, no produto final, não necessariamente, vamos encontrar a prova laboratorial de que ele é transgênico. E o que importa para o consumidor é saber se a matéria prima usada no produto é ou não transgênica”, explicou Ana Paula.
Para o deputado Heinze, os transgênicos são produtos seguros para consumo. “Os alimentos liberados para consumo humano passam por análise da CTNBio [Comissão Técnica Nacional de Biossegurança], composta por representantes de nove ministérios – como da Saúde, do Meio Ambiente e da Agricultura –, tem seis especialistas e 12 doutores nas áreas de saúde animal e humana, vegetal e ambiental. Portanto, se é liberado por esse colegiado de 27 membros, acredito que são seguros”, disse.
Mas, segundo o biomédico Luiz Maranhão, as consequências dos transgênicos na saúde humana são absolutamente desconhecidas e incontroláveis. “Nós só vamos saber na nossa terceira geração humana usuária de transgenia. Até lá, estamos sendo cobaias dos grandes aglomerados internacionais financeiros. O princípio que baseou o conceito de defesa à transgenia é que o gene animal no grão geraria uma reação que não haveria mais necessidade de agrotóxicos, mas isso foi uma enganação para convencer a população.”
A presidenta do Consea disse que é preciso fazer investimentos na agricultura familiar, na agroecologia e no estudo de sementes que vêm da seleção natural e da experiência de agricultores. “Essa ideia de que o transgênico chega com maior produtividade, que vai reduzir o uso de agrotóxico e que vai matar a fome do mundo não é verdade, porque essa tecnologia foi liberada e a fome do mundo é enorme – são 800 milhões de famintos. Não são as forças de mercado e essa tecnologia que vão resolver o problema. O Brasil saiu do mapa da fome em razão da valorização do salário mínimo e dos programas de distribuição de renda.”
Segundo a pesquisadora do Idec, estudos internacionais dizem que o uso de transgênicos traz impactos negativos ao meio ambiente e à saúde humana, como o desenvolvimento de tumores e de alergias alimentares. “No Brasil, quem apresenta os estudos para comprovar se é seguro ou não para consumo humano são as próprias empresas que têm interesse comercial. Então, há um conflito de interesse. Para o Idec, nós deveríamos adotar o princípio da precaução: não havendo nenhuma comprovação de que não faz mal, não deveríamos consumir. Mas aqui os interesses econômicos e o poder do agronegócio são tão grandes, que isso [a liberação de transgênicos] acontece, inclusive, com respaldo de muitos pesquisadores”, argumentou Ana Paula.
O biomédico Luiz Maranhão explicou que não é contra estudos genéticos, mas acha que eles estão sendo aplicados sem controle. “O estudo da transgenia não pode fugir das universidades e empresas públicas, não pode fugir do controle do Estado. Nos países da Europa – como França, Bélgica, Inglaterra, Espanha, Itália – esse conhecimento fica seguro e é controlado pelo Estado. Uma empresa de biotecnologia não tem idoneidade para comandar o que vamos colocar na nossa mesa. Mas, infelizmente, vemos o Estado brasileiro frágil diante desses avanços. É preciso que ele esteja presente de uma forma mais firme, assim como a sociedade organizada, para fiscalizar o Estado inclusive”, acrescentou.
Segundo a CTNBio, existem 39 tipos de plantas transgênicas aprovadas para comercialização no Brasil. O projeto de lei do deputado Heinze está agora no Senado Federal, para análise das comissões de Assuntos Sociais e de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle. A Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática enviou requerimento solicitando que também seja ouvida sobre a matéria. O Idec encabeça uma campanha em seu site contra o fim da rotulagem de produtos transgênicos e espera que os senadores rejeitem o projeto.
http://www.sul21.com.br/jornal/orgaos-da-sociedade-civil-alertam-sobre-fim-da-rotulagem-de-transgenicos/