“Às vezes, a única coisa verdadeira num jornal é a data”
Luís Fernando Veríssimo

sábado, 16 de junho de 2012

A Folha e meu pequeno mico - Tucanagem pura


16/06/2012 — Ivson

Como tenho um monte de leitura atrasada, adotei a tática de levar um livro – sempre menor e mais leve – na bolsa para ler nos 15 minutos que fico ônibus, deixando os mais pesados na cabeceira, para a hora de dormir. Assim, no momento, leio o “Memórias de uma guerra suja” no ônibus e “Sobre a China”, do Kissinger quando vou pra cama (a conjugação é totalmente acidental, mas bem significativa, só que isso é outra história). Foi o primeiro que me faz pagar um miquinho semana passada.
Na página 147 do “Memórias”, o assassino estatal Cláudio Guerra confirma a participação da Folha de São Paulo na Operação Bandeirantes (Oban) – grupo de militares e civis, que, financiados por empresários, capturava, torturava e matava esquerdistas nos anos 70, durante a ditadura militar. O jornal paulista cedia seus carros de entrega para os terroristas de Estado fizessem ações de campana e mesmo de captura e transporte de presos.
Isso tudo é sabido há séculos e mesmo o jornal não desmente os fatos, embora não os confirme claramente e peça perdão à sociedade brasileira (chegou a mencionar o fato, em passagem breve, no portal, em texto sobre os seus 90 anos). Talvez incomodados com a posição pusilânime dos Frias, os autores – provavelmente mais Marcello Netto, que trabalhou anos na casa e chegou a cargos de confiança, do que o Rogério Medeiros – resolveram tomar as dores do jornal numa nota de pé de página que termina assim:
“(…) A Folha de São Paulo teve papel destacado na luta pelo fim da ditadura militar, na instalação da democracia brasileira e na luta pelas eleições livres no Brasil. É hoje a mais combativa e independente publicação da imprensa brasileira”.
Diante dessa inopinada e veemente defesa do periódico dos Frias, soltei um “ah!”, misto de surpresa, decepção e escárnio. Quem me conhece, sabe que sou meio escandaloso às vezes e por isso estou acostumado a alguns olhares de censura (minha risada é de constranger qualquer um, menos a mim), mas confesso que o olhar feio da moça que estava no banco do outro lado do corredor, muito entretida em batucar no seu smartphone, me fez enfiar a cara no livro e me afundar um dentro do estofamento gasto.

Nenhum comentário:

Postar um comentário